PROPOSTA
A internação provisória consubstancia-se em medida cautelar, de natureza provisória e excepcional, a ser postulada somente na fase processual, a partir de representação socioeducativa oferecida pelo Ministério Público, uma vez presentes indícios de autoria e de materialidade (art. 108, parágrafo único; art. 174, caput e art. 182, §2º, todos da Lei nº 8.069/90).
JUSTIFICATIVA
A eventual pretensão policial de decretação da internação provisória do adolescente com o objetivo de aprofundamento das investigações para a elucidação da autoria do ato infracional, antes da instauração da ação socioeducativa por meio de representação, revela-se frontalmente incompatível com o microssistema estatutário de responsabilização do adolescente.
Com efeito, o Estatuto da Criança e do Adolescente organizou um regime próprio, completo e especial, com princípios, finalidades e rito distintos do processo penal comum, de modo que a incidência do CPP e apenas subsidiaria e cede quando a matéria já se encontra integralmente disciplinada pelo ECA (art. 152, caput).
Nesse desenho normativo, a internação provisória pressupõe que já tenha sido oferecida representação socioeducativa, não podendo ser decretada em procedimento cautelar prévio, tal como ocorre em relação ao adulto.
Registre-se que a internação provisória consubstancia-se em medida cautelar, a ser decretada no bojo de processo socioeducativo já instaurado a partir de representação oferecida pelo Ministério Público, uma vez presentes indícios de autoria e de materialidade.
Tal conclusão decorre da própria redação do artigo 108, caput do Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo o qual a internação provisória é cabível "antes da sentença", denotando claramente que se trata de medida cautelar processual admitida no curso de processo já instaurado e não na fase de investigação.
Ademais, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente explicita os pressupostos rigorosos da internação provisória, que deve se lastrear em indícios suficientes de autoria e de materialidade de ato infracional grave, demonstrada ainda a necessidade imperiosa da medida para a garantia da ordem pública ou da segurança pessoal do adolescente (art. 108, parágrafo único; art. 174, caput e art. 182, §2º, todos da Lei nº 8.069/90).
Registre-se que os sobreditos requisitos, por sua densidade, pressupõem a existência de justa causa mínima já apta a embasar, não legitimando, portanto, a criação de um espaço pré-processual de privação de liberdade para a confirmação da hipótese investigativa Em outras palavras: se há indícios suficientes de autoria e prova da materialidade, o Ministério Público dispõe de lastro idôneo para oferecer representação; se não há, falta o suporte constitucional-legal para a constrição extrema da liberdade do adolescente, que deve ser medida absolutamente excepcional.
Essa leitura sistemática e teleológica é condizente com a finalidade própria do sistema socioeducativo, que minimiza o rigor da justa causa exigida para a ação penal de adultos e remete a colheita probatória mais densa à fase judicial, sob o controle de um verdadeiro “juizado de instrução” estatutário.
Nessa linha, a legislação infantojuvenil dispensou a lógica do inquérito policial como condição de procedibilidade e reordenou as etapas, de modo a evitar que o adolescente sofra, sem processo, consequências gravosas que o sistema apenas tolera quando instaurada a relação jurídico-processual e assegurados os corolários do devido processo legal.
Diante de tal contexto, a internação provisória não é instrumento de investigação, mas medida cautelar excepcional vinculada exclusivamente ao processo, que se instaura com a representação oferecida pelo ministério Público, ocasião a partir da qual a autoridade judiciária poderá, fundamentadamente, decidir sobre a sua necessidade.
O entendimento acima perfilhado é sufragado pela doutrina especializada majoritária, que repele a transposição, por analogia, da prisão preventiva do adulto para uma suposta "internação cautelar" ou "internação temporária" pré-representação, não havendo previsão legal de tal instituto, exatamente porque o ECA institui disciplina própria e completa da cautelar de liberdade do adolescente, reservandoa ao iter processual e condicionando-a a requisitos materiais e formais mais rigorosos.
Proponente(s): Afonso Henrique Reis Lemos Pereira, Carolina Nery Enne, Carina Fernanda Gonçalves Flaks, Raquel Madruga do Nascimento.
