PROPOSTA
A prescrição de tratamento terapêutico intensivo para crianças e adolescentes deve observar a obrigatoriedade de matrícula e frequência escolar, conforme art. 205 da Constituição da República, arts. 4º, 54 e 55 da Lei nº 8.069/1990 (ECA) e art. 24, §1º, da Lei nº 9.394/1996 (LDB). Compete ao Ministério Público, na função de fiscal da ordem jurídica, requerer da parte autora a comprovação documental da compatibilidade entre o tratamento e a jornada escolar mínima legalmente exigida, sobretudo quando houver risco de comprometimento da frequência escolar em razão da carga horária de tratamento prescrita
JUSTIFICATIVA
1. Fundamento constitucional e legal
O art. 205 da Constituição assegura a educação como direito de todos e dever do Estado e da família. O ECA (arts. 4º, 54 e 55) reforça a obrigação de matrícula e frequência escolar, enquanto a LDB (Lei nº 9.394/1996) determina, no art. 6º, que os pais matriculem os filhos a partir dos 4 anos e, no art. 24, §1º, que a aprovação dependa de frequência mínima de 75%. Esses dispositivos impõem limites à sobreposição de terapias que comprometam a jornada escolar.
Na VI Jornada Nacional de Direito da Saúde (CNJ, 2023), o Enunciado nº 105 destacou que, em tratamentos de pessoas com transtornos do desenvolvimento, inclusive TEA, os magistrados devem avaliar a carga horária prescrita, o plano terapêutico, a especialização dos profissionais, a participação dos responsáveis e exigir avaliações periódicas que comprovem a eficácia do tratamento. Recentemente, na VII Jornada de Direito da Saúde – 2025, foram também aprovados os enunciados:
ENUNCIADO Nº 133
“Nos casos de tratamento de saúde judicializado, seja no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) ou da saúde suplementar, especialmente aqueles de alto custo ou de alta complexidade, recomenda-se que o juízo, ao deferir o pedido, determine a apresentação periódica de prescrição médica, exames e relatórios clínicos atualizados, a fim de permitir o monitoramento da efetividade terapêutica e da permanência da necessidade clínica do tratamento concedido, conforme previsto no art. 14 da Recomendação CNJ nº 146/2023.”
ENUNCIADO Nº 138
“Nas demandas judiciais sobre fornecimento de tratamento em favor de pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), recomenda-se ao Juízo, com vistas à efetividade da prestação e ao controle da execução, que avalie a conveniência de designar audiências de acompanhamento, com a inquirição dos responsáveis legais, para coleta de informações sobre a execução do tratamento, dificuldades de acesso, adesão, adequação terapêutica e eventual necessidade de ajuste das medidas, respeitando os princípios da proteção integral, da inclusão e da participação ativa da família.”
2. Compatibilização de direitos fundamentais
Os direitos à saúde e à educação devem ser harmonizados. Tratamentos intensivos não podem justificar a exclusão escolar, salvo em situações clínicas excepcionais. A prevalência absoluta de um em detrimento do outro afronta a convivência harmônica dos direitos fundamentais e prejudica o desenvolvimento integral da criança e do adolescente.
3. Plano terapêutico individualizado
A conciliação entre tratamento e escolarização requer plano individualizado, com justificativa clínica da carga horária, objetivos claros, avaliação do impacto escolar, estratégias compensatórias (contraturno, flexibilização curricular, apoio pedagógico) e parecer interdisciplinar de saúde e educação sobre a viabilidade.
4. Instrumentalização probatória e uso de tecnologia
A compatibilidade deve ser comprovada por laudos médicos, pareceres pedagógicos, relatórios terapêuticos e registros escolares. Ferramentas tecnológicas, inclusive de inteligência artificial, podem auxiliar na simulação de rotinas, avaliando a sobreposição entre atividades terapêuticas e escolares.
5. Atuação institucional do Ministério Público
Na função de fiscal da ordem jurídica, cabe ao Ministério Público exigir documentação que comprove a compatibilidade entre tratamento e frequência escolar mínima, evitando que demandas de saúde resultem em prejuízo educacional grave e irreversível.
Proponente(s): Luciana Menezes Wanderley Pires e Leonardo Cuña de Souza.
63 - Nota técnica Enunciado Institucional - CAO Educação
63- 2 - Nota técnica - Enunciado Institucional - CAO Cível
